domingo, 27 de março de 2011

Ele consegue escrever poeticamente o que não sei expressar....

Traduzir
Por José Saramago

"Escrever é traduzir. Sempre o será. Mesmo quando estivermos a utilizar a nossa própria língua. Transportamos o que vemos e o que sentimos (supondo que o ver e o sentir, como em geral os entendemos, sejam algo mais que as palavras com o que nos vem sendo relativamente possível expressar o visto e o sentido…) para um código convencional de signos, a escrita, e deixamos às circunstâncias e aos acasos da comunicação a responsabilidade de fazer chegar à inteligência do leitor, não a integridade da experiência que nos propusemos transmitir (inevitavelmente parcelar em relação à realidade de que se havia alimentado), mas ao menos uma sombra do que no fundo do nosso espírito sabemos ser intraduzível, por exemplo, a emoção pura de um encontro, o deslumbramento de uma descoberta, esse instante fugaz de silêncio anterior à palavra que vai ficar na memória como o resto de um sonho que o tempo não apagará por completo.

O trabalho de quem traduz consistirá, portanto, em passar a outro idioma (em princípio, o seu próprio) aquilo que na obra e no idioma originais já havia sido “tradução”, isto é, uma determinada percepção de uma realidade social, histórica, ideológica e cultural que não é a do tradutor, substanciada, essa percepção, num entramado linguístico e semântico que igualmente não é o seu. O texto original representa unicamente uma das “traduções” possíveis da experiência da realidade do autor, estando o tradutor obrigado a converter o “texto-tradução” em “tradução-texto”, inevitavelmente ambivalente, porquanto, depois de ter começado por captar a experiência da realidade objecto da sua atenção, o tradutor realiza o trabalho maior de transportá-la intacta para o entramado linguístico e semântico da realidade (outra) para que está encarregado de traduzir, respeitando, ao mesmo tempo, o lugar de onde veio e o lugar para onde vai. Para o tradutor, o instante do silêncio anterior à palavra é pois como o limiar de uma passagem “alquímica” em que o que é precisa de se transformar noutra coisa para continuar a ser o que havia sido. O diálogo entre o autor e o tradutor, na relação entre o texto que é e o texto a ser, não é apenas entre duas personalidades particulares que hão-de completar-se, é sobretudo um encontro entre duas culturas colectivas que devem reconhecer-se."

quarta-feira, 9 de março de 2011

P.A.I. - Por Amor Incondicional


Foi por esse amor incondicional que fui à SP durante o feriado do carnaval para visitar e saber como anda meu pai.
Confissão: foi muito difícil segurar a emoção ao vê-lo tão abatido, magro e com aparência de quem esteve muito doente.

Sinceramente, preferia tê-lo visto mais forte, menos inofensivo, afinal é meu pai e teoricamente deveria ser bem mais forte e seguro que eu, filha e mulher.
Senti uma enorme vontade de trazê-lo para perto de mim. Como se ele estivesse precisando de ajuda ou de colo, mas sei pela lógica da situação que nossas vidas se encontram que ele está bem e bem cuidado por aqueles que o adotoram como pai e esposo.

Meu nó na garganta foi pelo choque, pela surpresa....
Meu pai, há tantos anos distante da nossa família percebi que ele tenta saber de todos, uma curiosidade natural toma conta dele em seus questionamentos... Deixei que ele visse algumas fotos da minha máquina e ele então com seu jeito brincalhão, condição que a doença não tirou dele, a brincadeira e a gozação.... Ele riu das pessoas, disse que todos envelheceram muito, menos ele.
Enfim, depois escrevo mais melhor sobre essa pessoa tão especial na minha vida.